sábado, 12 de junho de 2010

Entrevista com Juarez Lopes


Existem certas reflexões que são cabíveis, ainda mais em tempos como os nossos, onde somos obrigados a engolir a vida como se fosse vinda de um enlatado -o que não é. "O caminho para o desenvolvimento de uma sociedade passa pelo autoconhecimento" - Felipe Figueira. Essa importante entrevista a Juarez Lopes revela o homem atrás da missão. Aproveite!



1. Fale sobre seu pai, Macário Lopes, e de como ele te influenciou como ser político.
R: Meu pai, com muita saudade até hoje, e lá se vão 38 anos, Macário Lopes, ex-militante da antiga UDN, foi presidente da ACIA e vice-prefeito na gestão do Prefeito Edilson Duarte. Era de uma ética e de uma honestidade impressionantes, e isso com certeza foram fatores que muito me influenciaram. Além disso, era uma pessoa muito culta, lia muito, e tinha uma forte relação com as coisas do mundo natural. Talvez venha daí, essa minha veia ambientalista. Para mim é um grande exemplo de como servir às causas sociais sem projetos pessoais.

2- O que é mais difícil: Ser pai ou filho? Você tem muitos filhos, não é? Fale um pouco dessa relação com eles.
R: Quando se tem uma família como a minha, as duas funções são gratificantes. Só vale a pena! O grande desafio da paternidade ou da maternidade, é com a formação para o mundo, para a vida. Tenho quatro filhos e muito orgulho deles. São a extensão da minha vida e acho que cumpri o meu papel. Como diz João Nogueira, “ se meu pai foi espelho em minha vida, quero ser pro meu filho espelho seu...”. Fazer isso gratifica e mostra um mundo possível quando investimos em educação formal ou não.

3. Você tem fome de quê?
R: De ética! É muita injustiça espalhada no nosso cotidiano, sem que sejam responsabilizados aqueles que deveriam cumprir o papel para o qual foram indicados. Quero contribuir, mostrar que é possível viver com ética, ser cidadão, criar filhos e participar do processo político. Entrar e sair com dignidade.

4- O que te impulsiona a continuar pleiteando um cargo político, num país onde os políticos são tão vergonhosamente desonestos? Não tem medo de comparações?
R: A busca pela justiça social. O fato de termos um processo político contaminado não indica o fim da linha, pelo contrário. Indica que devemos lutar contra este estado de coisas. Defendo que a política seja lugar de gente séria. A minha utopia é que os homens de bem acordem e se disponham a contribuir. Não tenho medo de comparação porque tenho história, tenho currículo, relações com o mundo real, com a militância sadia, com a defesa da verdade.

5- Como foi a sua saída do Partido dos Trabalhadores, ao qual era um dos mais antigos filiados? Como vê a postura do partido hoje em relação a política municipal?
R : Em 2004, era um dos pré-candidatos a vereador pelo Partido dos Trabalhadores e defendia, já naquele momento, em função das candidaturas majoritárias postas à mesa, uma candidatura própria do partido a prefeito, para mostrar maturidade política e diferença de visão em relação ao processo em curso e que mais tarde se revelou nisso que estamos vendo hoje em dia. Perdi a disputa democraticamente e retirei minha pré-candidatura em função da decisão partidária. Mais tarde, quando fui convidado, pelo meu amigo Alfredo Barreto, a assumir a Secretaria de Meio Ambiente e Pesca em nome do PT, num processo democrático em que disputei a indicação com outros dois companheiros, apresentei , como condição, um Planejamento para a Secretaria que iria se formar, o que foi aprovado em plenária pelos membros do Diretório Municipal. Feito isso, arregaçamos as mangas, respiramos fundo e fomos pro trabalho. Foram dois anos de muito trabalho (chegava a quatorze horas diárias), muitas conquistas e muitas dificuldades em função do perfil que o governo montara para dar conta da tal governabilidade. Quando as propostas do planejamento que apresentei, e ai uma delas era a discussão do orçamento da Secretaria de Meio Ambiente, começaram a ser travadas, numa disputa interna, procurei a direção do PT e coloquei claramente: “ sem orçamento, com 0,1 %, não fico. Não tenho como avançar mais”. O Partido preferiu ficar com o governo, se confrontando com aquilo que havíamos aprovado. Me senti isolado, excluído e saí como entrei, tranqüilo com a consciência do dever cumprido. Vejo o PT hoje sem forma, sem identidade, acompanhando a política local sem peso, sem influir, sem propor, o que contraria a sua história.

6- Já dizia o Cazuza: "...ideologia, eu quero uma pra viver." Do que não abre mão na política?
R: Da honestidade e da busca incansável por um novo paradigma em que a verdade seja o seu eixo condutor.

7- Você descobriu, a algum tempo, ser portador da Hepatite C. Você se importa em falar sobre isso?
R: Não. Defendo a verdade de cada um e sua respectiva responsabilidade. Pelo contrário, isso é bom. Tudo na vida é dual, bom e ruim, bonito e feio, verdade e mentira, e com a hepatite C , para mim, não foi diferente. Embora tenha sido atingido, literalmente no fígado, me sinto mais inteiro. Tenho dito que o meu contrato anterior com a vida venceu, e agora eu tenho um novo contrato, com outras bases, mais honestas. Precisei passar por isso para enxergar coisas simples. Mais uma vez citando João Nogueira: “.. a vida é mesmo uma missão, a morte é uma ilusão, só sabe quem viveu, pois quando o espelho é bom, ninguém jamais morreu “.

8- Mário Sérgio Cortella, filósofo da USP, diz que os brasileiros confundem esperança de esperar com esperança de esperançar. Ainda devemos ter alguma esperança em se tratando da política brasileira?
R: Leonardo Boff, um dos meus ídolos e referência de cidadão planetário, diz que temos que mudar se quisermos continuar, e que as mudanças já são notadas por todos os cantos, na emergência de valores perenes da condição humana. É hora do ganha-ganha em vez do ganha-perde, da busca do bem viver, base para a felicidade que hoje é fruto da simplicidade voluntária e de querer ter menos para ser mais. Isso é esperançoso. Nessa direção haveremos de progredir! Não devemos ter dúvida, a nossa jovem democracia vai dar a volta por cima.

9- Você é tido como um cara radical, muito sério, introspectivo... E aí, você pega o violão, faz um show, canta Chico, Vinícius, Jobim. Se abre ao público, se emociona. Quem é Juarez, na verdade?
R: Sou muito sério com as coisas públicas e com a tomada de decisões que importem em prejuízos a terceiros, e não poderia ser diferente. Fora isso, me considero um cara bem humorado. A introspecção é, talvez, uma forma de defesa , uma forma de dizer a mim mesmo: “... cuidado com o andor que o santo é de barro...” Quanto a ser radical , “ referente a raiz, fundamental, essencial , que pleiteia reformas na organização social ...”, sim , esse é o Juarez Lopes. Não transijo com a mentira, com o falso conhecimento, com o discurso vazio. Defendo a verdade e os objetivos traçados , com conhecimento e visão radicular, profunda, sem invenções. E aí, a música é a minha raiz, minha inspiração, meu porto seguro. Na música , a harmonia é fundamental e a afinação indispensável, como na vida, como na ação e no trato com as coisas públicas.

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